domingo, 23 de junho de 2013

CRÔNICAS FACEBOOKIANAS - SOBRE FEIJÕES E EXPLOSÕES – por Roberto Pompeo – 23/06/2013


Dia desses a panela de pressão lá em casa explodiu.




Não entendo nada de panelas, portanto foi necessária uma perícia culinária. As conclusões foram as seguintes:
i. foi colocado feijão demais na panela (imprudência);
ii. a tampa não foi corretamente vedada (imperícia);
iii. a panela ficou sem qualquer supervisão, pois a pessoa responsável pelos feijões saiu para fazer compras, abandonando a panela no fogo (negligência).
iv. nessas condições, a explosão da panela era inevitável.

Os danos à cozinha foram extensos, a tampa da panela enterrada no teto de gesso, muitas baixas entre os feijões e os que sobreviveram ficaram inválidos, máculas negras perenes por toda a cozinha, que parecia um campo de batalha, a própria panela toda retorcida, imprestável ao uso futuro, um quadro dantesco.



Só quem passou por uma experiência dessas sabe a que me refiro... E a pergunta que todos nos fazemos sempre que uma panela de feijão explode é: de quem é a culpa?
Nas minhas lucubrações filosóficas sempre achei que a melhor pergunta seria: "quem é o responsável?", pois ingenuamente acredito que onde há responsáveis não interessa tanto encontrar culpados.
Mas invariavelmente, a pergunta gira em torno da culpa, pois a cozinha é uma parte da casa onde talvez a noção de responsabilidade ainda não tenha chegado ou onde talvez seja de interesse dos responsáveis a busca estéril aos culpados.

Então, deixo a pergunta sobre o mistério da panela de pressão que explodiu na minha cozinha: de quem é a culpa? Da panela, do feijão, do fogo ou da pessoa que largou a panela no fogo e foi às compras?!




quinta-feira, 6 de junho de 2013

CONTOS SECOS - AS MULHERES QUE NÃO QUERIAM SER AMADAS PELOS HOMENS – por Roberto Pompeo – 06/06/2013


Soraya Marilin andava acabrunhada pelos cantos da casa, sem voz para nada, nem para os cantos que entoava. Sua mãe se preocupava com a desinfelicidade da filha e a interpelava sobre as razões de tal estado, ainda que já intuísse nas suas percepções de mãe que o semblante refletia o coração.
Por converseios tortos, como as mulheres são hábeis em fazer, se achegou à moça para extrair confissão. Ela, Marilin, como a chamava a mãe, reclamosa, colocou as causas do seu pesar sobre Juliano, moço que andava à roda dela sempre cheio de cortesias desfazendo-se em diligências e gentilezas, tudo para agradar Soraya.
A mãe logo foi perguntando o que ele havia feito, se lhe havia agravado agredido ou injuriado, ao que a moça respondeu que muito ao contrário. Era ela que movida por pensamentos que nem pareciam seus fazia de tudo para desfazer do rapaz. Esforçava-se para afastá-lo de si. Mas parecia que quanto mais ela agia assim, mais ele se desdobrava para agradá-la. Ignorava as ofensas, relevava as ausências e fazia ouvidos moucos às exortações para se afastar e desaparecer.
Fosse um homem, a mãe mostraria confusão ante tão despropositada declaração. Desde quando é ruim a gentileza? Mas sendo mulher apenas sorriu, abraçou a filha e nem precisou dizer, pois a comunicação ficou naquela esfera gestual e telepática delas, mas pensou que apesar de todas manifestarem sonhos e desejos de um homem que mude sua vida e as ame incondicionalmente, as mulheres não querem realmente isso. Querem, ao contrário, imprevisão, surpresa, e mesmo sem jamais admiti-lo até condução. Uma pitada de dificuldade também não vai mal, pois o que fácil vem, fácil vai, diz o ditado popular. Querem um homem que magicamente lhes retire a armadura.
Então, ali no sofá da sala, dentro do abraço da mãe, o acabrunhamento de Soraya se foi dissipando, dissipando, até que se evaporou todo. Afinal, já estava quase na hora de Juliano tocar a campainha, pontual como um cuco, quem sabe trazia uma rosa para ela dizer que preferia camélias, ou uma camélia para ela dizer que preferia rosas.
Quando o ponteiro maior do relógio excedeu um minuto Soraya desassossegou. Quando já se iam cinco, desesperou. Contendo a respiração acelerada, maquiando o transtorno e mal disfarçando a ansiedade, partiu lépida para a praça central da cidadinha, direto ao café, ponto de encontro de todos os homens.
Que era feito de Juliano, alguém o vira? Claro, a menina não sabia? Tinha partido naquela mesma manhã, de mala e cuia, embora para a cidade ninguém sabia qual, uma grande. Pelo jeito que foi, era pra não voltar. Até pagou a conta que já estava pendurada fazia tempo.
O sangue sumiu do rosto de Soraya. Já era branquinha, ficou quase translúcida. Nem ouviu lhe oferecerem um copo d’água, partiu para casa, ausente de si mesma. Daquele dia em diante todos os dias esperava o único ônibus da capital, acompanhando o desembarque até o último passageiro. Perdeu toda a graça que já tivera muita. Nunca mais voltou ao normal.
No dia em que partiu, naquele ônibus, Juliano com os olhos marejados só pensava em por que as mulheres não queriam ser amadas pelos homens...